Depois de realizar a première mundial na competição oficial de Cannes, em maio deste ano, Motel Destino, novo filme do cineasta cearense Karim Aïnouz, chega aos cinemas de todo o Brasil em 22 de agosto. O thriller erótico é protagonizado por Iago Xavier, ator revelação selecionado por teste entre outros 500 nomes.
No longa, sob o céu em chamas numa beira de estrada do litoral cearense, o Motel Destino é palco de jogos perigosos de desejo, poder e violência. Uma noite, a chegada do jovem Heraldo transforma em definitivo o cotidiano do local.
Na última quarta-feira, dia 14 de agosto, estivemos presentes na coletiva de imprensa do filme em São Paulo, evento que contou com a presença de do diretor Karim Aïnouz e dos membros do elenco Iago Xavier, Nataly Rocha e Fábio Assunção, além dos produtores Janaina Bernardes e Fabiano Gullane. Eles falaram sobre as gravações do filme, o retorno do diretor ao Ceará e sobre como foi gravar um filme que se passa praticamente todo dentro de um motel. Confira o que rolou nesse bate papo.
Para começar, Karim Aïnouz revela que a última vez que havia trabalhado em sua terra natal foi há 14 anos. Por conta de mudanças de governo, muito projetos foram cancelados e ele passou muito tempo sem retornar ao Brasil – atualmente ele vive em Berlim, na Alemanha. Durante a pandemia, trabalhou em um filme na Inglaterra, mas estava com saudade de fazer um filme em português e mais do que isso, de trabalhar especificamente no Ceará. Para ele, Motel Destino foi a oportunidade de colocar na tela toda a eletricidade do nordeste.
O longa mostra dois dos personagens principais que, segundo o diretor, foram praticamente sequestrados pelo motel titular: Heraldo por estar em fuga e Dayana por ter casado com Elias, o dono do motel. Além disso, são dois personagens que são diferentes, mas que tem muito em comum e acabam se unindo ao Dayana perceber no olhar de Heraldo que ele precisava de ajuda, a solidariedade dela reflete um reconhecimento de sua própria situação.
Fábio Assunção era o único dos atores que não é natural do Ceará e no filme, interpreta um carioca. Para ele, seu personagem chega precisando “impor uma certa forma de poder” e foi difícil interpretar esse homem chegando do sudeste e mostrando a visão que ele tem do Ceará, de que é um local “para se esconder, um local de clandestinidade”. Ele também fala que motéis podem ser locais “onde há uma certa permissividade à crimes, é um lugar perigoso, um espaço de confinamento dele com a mulher dele”. Reforçando o fato de Dayana ser uma mulher que segue naquele local contra sua vontade.
Os atores e equipe tiveram um mês de ensaio antes do início das filmagens, o que deu tempo para o Assunção aprender sobre as diferenças culturais. Para que o texto ficasse mais real e mostrasse a forma correta de um cearense falando, os atores tiveram a liberdade de usar suas próprias palavras e expressões, sem precisar seguir exatamente o que estava no roteiro.
“Acredito que esse processo for surgindo durante esse mês de preparação. A gente ensaiou na locação e a gente foi muito aberto para explorar algumas coisas além do texto. Para deixar alguns sentimentos vir e deixar o processo muito mais fluido e muito mais intuitivo”, revela Iago Xavier. “O Karim acredita muito na intuição dos atores, acredita muito no que a cena tá pedindo e no que os nossos corpos tem a entregar”.
Motel Destino conta com muitas cenas de sexo e de nudez, para Xavier “o alicerce principal é você se sentir confortável e se sentir confiante para jogar o seu corpo de uma maneira tão aberta e estar aberto para esse jogo, tanto com os meus companheiros de cena quanto com meu diretor”.
Nataly Rocha destaca que a equipe do filme também é muito importante para a ajudar a ter conforto nesse tipo de cena. “Me ajudou a me sentir muito confortável ter uma mulher fotografando. Como o Karim conduz esse processo, foi muito confortável para poder dar a minha opinião. Não existia um roteiro pronto, o roteiro era trabalhado o tempo todo, inclusive durante as filmagens. E não só nas cenas de sexo, como você é tratado durante todo o processo de ensaios e durante as outras cenas fazem com que as cenas de sexo sejam só um reflexo disso”.
“O Karim te escuta, é uma pessoa extraordinária. Isso faz com que você se sinta a vontade. Isso tudo vai te dando autoestima e vontade de contribuir para o filme. Isso vai pro corpo, totalmente”, completa a atriz.
O diretor diz que o roteiro original possuía muitos diálogos, mas que durante a produção “parte do que está escrito ali não precisa fazer porque você já está vendo, já está sentindo. Pra mim, os diálogos são pautados por esse julgamento. O que de fato é preciso dizer e o que não precisa dizer, porque está sendo visto ou sendo escutado. Eu sempre faço os takes que eu preciso e depois que eu tenho o diálogo e que eu entendo que a emoção foi conquistada, eu sempre peço para os atores fazerem as mesmas passagens com as mesmas ações em silêncio. Os planos que mais ficam no filme são essas passagens em silêncio. A troca de olhares e a sinergia que você tem nos corpos é muito forte”.
O filme foi filmado em Beberibe, no Ceará e a escolha foi feita por ser o local com o motel perfeito para as gravações, por conta de seus quartos grandes e do corredor que aparece dezenas de vezes em várias das cenas. Grande parte da filmografia Karim Aïnouz se passa em locais amplos, mas em Motel Destino seus personagens estão confinados em um local que é quase claustrofóbico. Segundo o diretor, essa ideia de gravar num local só veio na pandemia, mesmo porque naquela época, só poderiam fazer dessa forma. Além disso, é um filme que se passa em “um espaço de prazer, um espaço de possibilidade de tudo que você imagina. O motel é o terreno da fantasia, de todos os tipos de fantasia. É o terreno da ilegalidade, porque o que você faz ali dentro não dá pra ninguém saber e ele é uma espécie de prisão”.
Para finalizar o bate papo, o diretor revela que Teorema de Pier Paolo Pasolini foi uma de suas inspirações para Motel Destino, mas desejava fazer algo menos contemplativo e mais eletrizante, com referências ao trabalho de Brian De Palma. Para ele, o cinema erótico foi sendo deixado de lado com o tempo e com seu novo longa pretendia uma retomada do estilo à telona.