Bandida - A Número Um Bandida - A Número Um

Bandida – A Número Um | Saiba o que rolou na coletiva do filme

Divulgação

O longa Bandida – A Número Um, de João Wainer, conta a história real da primeira mulher a chefiar o tráfico de drogas na Rocinha, nos anos 80. Estrelado por Maria Bomani, o filme de ficção é baseado no romance A Número Um, de Raquel de Oliveira. A trama acompanha a trajetória de Rebeca (nome da personagem inspirada em Raquel), que aos 9 anos de idade é vendida pela própria avó para o bicheiro que comandava o morro. Anos mais tarde, imersa em um mundo de corrupção e violência, ela assume o bando e toma o posto de número um do tráfico de drogas da favela.

No dia 28 de maio participamos da exibição do filme para a imprensa, que foi seguida de um bate papo com João Wainer, Maria Bomani, Milhem Cortaz (Amoroso), Jean Amorim (Pará, companheiro de Rebeca), Otto (Del Rey da Rocinha), Veronica Stumpf (da Paris Entretenimento) e a autora do livro Raquel de Oliveira.

Veronica Stumpf começou a conversa revelando que o projeto demorou cerca de sete anos para ser feito e desde o início conquistou os produtores por ser uma história forte e repleta de camadas, “não é só uma história de favela, de tráfico, de drogas, mas uma história com muitas camadas, com muita reflexão, com um olhar de empoderamento”.

O diretor João Wainer disse que além de contar uma história, Bandida – A Número Um propõe uma linguagem estética com muita textura inspirada nos filmes para TV dos anos 80, fazendo um estudo de gênero. O filme foi todo filmado utilizando uma Betacam – câmera que não se usa mais hoje em dia, mas que era ao principal equipamento na época em que o filme se passa. Segundo ele, “sabendo que todo o material de arquivo que a gente ia precisar usar no filme vinha com essa textura de Betacam, a gente falou ‘vamos botar uma Betacam no set porque aí a gente vai conseguir fazer com que tudo cole’. Te dá a sensação de que você está naquela época, porque a gente tá vendo a textura da câmera que a gente via naquela época”.

“A gente tem uma trilha que eu também acho que é um dos pontos mais altos do filme. A trilha foi feita pelo Tejo Damasceno. A gente tem Fagner. Uma cena de ação com Deslizes do Fagner é uma coisa que eu acho legal. A gente tem BaianaSystem também, que é um negócio super moderno, com um remix do TropKillaz daquela música do Saci que eu acho que é uma música que representa muito aquelas crianças de algum jeito […] A gente tem O Amor e o Poder ali na frente, que eu acho que é uma música que remete muitas lembranças […] Deslizes era a música original do casal do livro que deu origem à essa história. O filme é isso, são essas camadas que vão sendo colocadas uma em cima da outra e a sensação que o espectador sente quando você junta todas essas camadas é o que vale”, finaliza o diretor sobre as escolhas feitas para o filme.

Bandida
Crédito Karyme França

Ainda segundo João Wainer, ao fazer um filme sobre bandidos, não se pode julgar. É preciso apenas contas a história como ela é. “Eu venho do jornalismo e trabalhei muitos anos em cadeias, trabalhei no Carandiru. Se eu começar a entrar na onde de julgar, já era”.

Milhem Cortaz aponta que filmes de favela que contam histórias de bandidos já foram feitos muitas vezes no Brasil, mas que Bandida – A Número Um traz pela primeira vez uma história desse tipo com uma protagonista feminina. “Pela primeira vez é a visão de uma personagem protagonizando tudo isso e saindo daquilo sem ser a passiva e sim fazendo parte do processo”.

A produtora Veronica Stumpf  completa, “ela é muito dona de sei. Ela teve que, em um ambiente que muitas de nós como mulheres não saberíamos como agir, talvez a gente fosse se tornar refém da gente mesma, ela conseguiu achar um caminho. Ela conseguiu vencer. Vencer os homens, vence a violência à qual ela foi submetida, vender a opressão. Ela é uma mulher que dominou a sua própria vida”.

A escritora Raquel de Oliveira avisa que nem tudo que está no filme aconteceu exatamente daquela forma, já que ele foi baseado no livro que é a romantização de sua vida e não uma biografia. “É a história da minha vida. Eu passei por essas situações. O filme é um recorte dessa história, inspirado livremente – porque em uma hora e pouco a gente não iria conseguir botar tudo o que está escrito”.

“Ele mostra o tráfico de drogas como uma situação que faz um atravessamento na vida das pessoas. Ele também não criou heróis, como a gente vê por aí […] Ele mostrou pessoas, ele humanizou aquilo que é uma situação e mostrou com muita sensibilidade as opções naquela época. E que persistem até hoje, só que com outras vertentes, com outras faces”, continua ela sobre a maneira que o filme tratou seus personagens.

“Todo mundo é vítima. Desde o policial que atira até o bandido que leva o tiro do lado de lá. São todos vítimas de uma parada que é muito maior do que isso e quem tá se dando bem e ganhando dinheiro, está de gravata no ar condicionado, de boa, quietinho enquanto está todo mundo se fodendo lá embaixo. Não tem herói e vilão, todo mundo é vítima de um sistema que é absolutamente cruel, péssimo e escroto, que provoca esse tipo de coisa e que chegou onde a gente chegou hoje no Rio de Janeiro”, completa o diretor.

bandida
Crédito: Karyme França

Sobre atuação, Maria Bomani revela que foi um choque receber o convite para interpretar Rebeca, pois foi sua primeira protagonista. Foi necessário bastante preparação lendo o livro e buscando saber tudo sobre o casal que sua personagem formava com Pará. Também disse que teve a liberdade de expor suas ideias e teve muitas trocas com outros atores, preparadores de elenco e outros membros da equipe.

Para a atriz as crises de sua personagem eram um desafio, “fazer cinema é uma loucura. A gente gravou duas décadas em um dia, gravou década de 1980 como adolescente e logo em seguida, na fase adulta, uma cena de claustrofobia. Entrar nesse estado é muito difícil, foi muita técnica. Meu preparador ficava ali o tempo todo orientando para eu conseguir entrar na personagem, conseguir mergulhar naquela situação e não desencadear uma crise na gente. Eu tenho crise de pânico, ansiedade e depressão. Imagina fazer isso para a personagem e depois não conseguir voltar?”

Para Jean Amorim, o fato de ter nascido e vivido em uma favela ajudou na hora de construir seu personagem, pois viveu muito da realidade mostrada no filme, incluindo a violência. “Eu fui buscar essa visão do interior que quem vive dentro das comunidades”. Segundo ele, o roteiro poderia ter caído em um clichê sobre pessoas que vivem em favelas, mas houve um trabalho de se aprofundar nas circunstâncias que fazem com que as pessoas entrem para o crime. Ainda sobre seu personagem ele disse, “o Pará é um vacilão, um cabaço. Se não existisse a Rebeca na vida dele, ele não existiria. Ele não passaria do Del Rey. El chegaria ali e pararia ali mesmo.”

Segundo a equipe do filme, as favelas nos anos 1980 eram compostas majoritariamente por pessoas brancas e nordestinas que iam procurar emprego no Rio de Janeiro, acabavam não encontrando e paravam nesses locais por não terem condições financeiras de irem para outros locais ou de voltarem para seus antigos lares. Por esse motivo alguns dos atores escolhidos são nordestinos e o sotaque da maioria dos personagens do filme passa bem longe do sotaque carioca visto em outros filmes do gênero.

“Uma herança do Jogo do Bicho, que foi o primeiro poder político dentro das favelas. Veio com pessoas do êxodo do nordeste. Elas vieram para trabalhar e acabaram pegando aquele oficio porque muitas não conseguiam trabalho e ficavam passando fome nos becos. Por isso vendiam as crianças. A maior parte desse pessoal era nordestino. O tráfico assistencialista também é uma herança do jogo do bicho”, diz Raquel de Oliveira.

Para finalizar, a autora fala sobre seus sentimentos ao ver o filme pronto. “As cenas de sexo mexeram muito comigo. O abraço que eu dei no Jean depois foi quase sexual [risos]”. Ela continua, “foi muito bom ver uma história tão miserável como a minha ser traduzida com a sensibilidade que essas pessoas colocaram. […] Chorei pra caramba e queria agradecer à Maria por uma oportunidade que nesses mais de 30 anos eu nunca tive tempo pra ter. Ela chorou um luto que eu nunca tinha chorado […] Aquele luto que ela chorou quando eu tava lá sentadinha [assistindo ao filme], eu tive a oportunidade de chorar esse luto porque o Pará foi o grande amor da minha vida”. 

Bandida – A Número Um tem data de estreia marcada para 20 de junho nos cinemas, com distribuição da Paris Filmes.